Brasao TCE TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DO TOCANTINS
GABINETE DA 5ª RELATORIA

   

8. VOTO Nº 109/2020-RELT5

8.1. Trata-se de expediente apresentado pela Prefeitura de Colinas do Tocantins, por intermédio do seu mandatário, no qual veicula requerimento para manifestação desta Corte de Contas no que concerne à proposta de Termo de Ajustamento de Gestão daquela municipalidade com o Estado do Tocantins, tendo como objeto de controvérsia a gestão do Hospital Municipal de Colinas do Tocantins relativamente aos atendimentos de média e alta complexidade de saúde, bem como questionamento quanto à inclusão dos servidores da área da saúde no cálculo do limite de despesas de pessoal a que se refere o art. 20, inciso III, da LRF.

8.2. Conforme se afere da peça inicial apresentada a esta Corte de Contas, o requerente, Prefeito de Colinas do Tocantins, pretendeu obter manifestação do Tribunal a respeito de dois pontos distintos:

  1. A firmação de Termo de Ajustamento de Gestão entre o Município de Colinas e o Estado do Tocantins, com o propósito de pactuar a assunção, pelo Estado, da gestão do Hospital Municipal de Colinas do Tocantins/TO, tendo em vista que, atualmente, é a municipalidade quem mantém referido nosocômio, com atendimentos de média e alta complexidade, sem que haja nenhuma contrapartida financeira por parte do Estado, exigindo que o Município suporte tais serviços regionais (art. 17 e 18, da Lei Federal nº 8.080/1990 e art. 152, II, da Constituição do Estado do Tocantins) com recursos próprios, o que extrapola a órbita de sua competência.
  2. A possível consideração, para efeitos dos limites estabelecidos pelo art. 20, inciso III, da Lei Complementar nº 101/2000-LRF na despesa de pessoal da área da saúde do município, somente os gastos com servidores que atuam na atenção básica, expurgando os gastos com pessoal no atendimento de média e alta complexidade.

8.3. Consoante consignado no Despacho 412/2020-RELT5, quanto ao primeiro pleito, não se revela possível o seu acolhimento, eis que veiculado por instrumento processual incompatível com a pretensão deduzida. É que, nos termos do art. 150, do Regimento Interno desta Corte, a consulta deve consubstanciar dúvida quanto à aplicação de dispositivos legais e regulamentares, tendo sido subscrita por autoridade competente (inciso I), sobre matéria de competência do Tribunal de Contas (inciso II), contendo, ainda, a formação de quesitos objetivos (inciso III), o nome legível, a assinatura e a qualificação do consulente (inciso IV), acompanhada de parecer do órgão de assistência técnica ou jurídico da autoridade consulente (inciso V). Releva assentar, ademais, que a consulta será formulada em tese, ou versará sobre dúvidas quanto à interpretação e aplicação da legislação em caso concreto (§3º do art. 150).

8.4. O requerimento quanto à formulação de proposta de Termo de Ajustamento de Gestão, destarte, não se enquadrada nos pressupostos acima mencionados, seja porque não suscita dúvida acerca da aplicação de dispositivo legal ou regulamentar, mas requer determinação para que o Estado seja compelido a firmar eventual TAG entabulado por esta Corte, seja porque versa sobre caso concreto, insuscetível de manifestação em tese.

8.5. A despeito disso, dessume-se do pronunciamento externado pela Coordenadoria de Análise de Contas e Acompanhamento da Gestão Fiscal – COACF, que, no tocante à transferência da gestão do Hospital Municipal de Colinas ao Estado do Tocantins, observa-se que esta já foi aprovada pela Resolução-CIB/TO (Comissão Intergestores Bipartite) n 132, de 07 de junho de 2018, estando em fase derradeira de aprovação, aguardando apenas a decisão do Governador.

8.6. Em vista dessas circunstâncias, não obstante a inadequação da via eleita, reputo pertinente expedir notificação ao Governador do Estado do Tocantins para que se manifeste acerca do andamento do processo administrativo concernente à Resolução CIB/TO nº 132, de 07 de junho de 2018, bem assim a intenção de firmar o Termo de Ajustamento de Gestão aventado pelo Município de Colinas do Tocantins, em caso de pender controvérsia relativamente à transferência de gestão do Hospital Municipal de Colinas. Isso porque, ao teor do que dispõe o art. 4º, da Instrução Normativa nº 01/2019-TCE/TO, o processo do TAG, marcado pela consensualidade e coordenação entre eventuais interessados, inicia-se por fase preliminar de tratativas entre o Conselheiro relator e os gestores interessados/responsáveis.

8.7. Não há de se cogitar, desta feita, da imposição ao Estado do Tocantins para que subscreva ou adira a Termo de Ajustamento a respeito do qual não anuiu ou de cujo conteúdo não teve conhecimento, sob pena de vulnerar o próprio escopo do acordo, que, segundo o art. 1º da IN nº 01/2019, presta-se à regularização voluntária de atos e procedimentos irregulares. Assim, a depender da manifestação aposta pelo Estado, verificar-se-á a possibilidade de dar seguimento à proposta de TAG em autos apartados, mediante desentranhamento promovido neste processo.

8.8. No tocante ao segundo ponto referido no requerimento inicial, relativo ao questionamento a respeito da possibilidade de consideração, para fins de contabilização das despesas de pessoal (art. 20, inciso III, da LRF), apenas dos gastos com servidores que atuam na atenção básica, excluindo-se os dispêndios realizados no atendimento de média e alta complexidade, informa a unidade técnica (Despacho nº 201/2020) que referida controvérsia já foi objeto de consulta a esta Corte, que, através da Resolução nº 509/2014-TCE/TO, exarou o seguinte entendimento:

  1. As despesas decorrentes da contratação de pessoal, custeadas com recursos oriundos de transferências correntes, seja da União ou do Estado, devem ser computadas no cálculo da despesa total com pessoal, estando sujeitos aos limites e condições impostas pela Lei Complementar nº 101/2000 – Lei de Responsabilidade Fiscal)
  2. Os gastos com pessoal dos agentes vinculados aos Programas de Saúde, a exemplo da Equipe de Saúde da Família – ESF, Agentes Comunitários de Saúde – ACS, Agentes de Combate às Endemias – ACE, Núcleos de Apoio à Saúde da Família – NASF, por sua natureza não eventual, não se enquadra no elemento de despesa “outros serviços de terceiros – pessoa física”, devendo os referidos gastos ser computados para fins de limite com pessoal independentemente do ente transferidor do recurso.

8.9. A este propósito, conforme assentado no item 5.6 do Despacho nº 412/2020-RELT5, a matéria indagada guarda pertinência ao instrumento processual elegido (Consulta), eis que veicula dúvida referente a aplicação de dispositivo legal (art. 18 e 20, inciso III, da Lei Complementar nº 101/2000), bem assim atende aos requisitos formais estabelecidos no art. 150 e ss. do Regimento Interno da Corte, razão pela qual, neste tocante, merece ser conhecida.

8.10. De início, para elucidação da questão, mostra-se oportuno transcrever excerto da peça inicial apresentada, no que aborda a fonte de custeio dos serviços de saúde referentes ao Hospital Municipal de Colinas – TO, objeto da presente controvérsia.

“(...)

Os gastos com o referido hospital são custeados pelo repasse do FNS e complementados por recurso da Prefeitura de Colinas do Tocantins/TO, sem nenhuma contrapartida do Estado do Tocantins, quando o Município, por inércia do Estado, está sendo obrigado a suportar com recursos próprios um serviço regional, que extrapola a órbita de sua competência, com sérios impactos na gestão municipal”.

8.11. Com efeito, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) definiu a despesa total com pessoal (art. 18, caput) de forma abrangente, compreendendo o somatório dos gastos do ente da Federação com os ativos, os inativos e os pensionistas, relativos a mandatos eletivos, cargos, funções ou empregos, civis, militares e de membros de Poder, com quaisquer espécies remuneratórias, tais como vencimentos e vantagens, fixas e variáveis, subsídios, proventos da aposentadoria, reformas e pensões, inclusive adicionais, gratificações, horas extras e vantagens pessoais de qualquer natureza, bem como encargos sociais e contribuições recolhidas pelo ente às entidades de previdência.

8.12. Disso decorre que, mesmo sendo custeados com receita oriunda de transferência intergovernamental, os gastos, de qualquer natureza, com pessoal vinculado ao ente recebedor do recurso devem ser computados na sua despesa com pessoal, e, por conseguinte, incluídas no limite máximo estabelecido pela lei, conforme outrora exposto na Resolução nº 509/2014-TCE/TO.

8.13. A propósito, a matéria já foi enfrentada por outros Tribunais de Contas, merecendo menção os seguintes julgados:

1. Os gastos decorrentes da contratação de profissionais de saúde para execução de ações previstas em estratégias incentivadas pela União, realizadas no âmbito da Atenção Básica em saúde, a exemplo da Saúde da Família – SF, Agentes Comunitários de Saúde – ACS, Agentes de Combate às Endemias – ace, além dos recursos destinados aos Núcleos de Apoio à Saúde da Família – NASF, que compõem o Piso de Atenção Básica Variável – PAB Variável, devem ser computados no cálculo da despesa total com pessoal fixada no caput do art. 18 da Lei Complementar nº 101/2000 – Lei de Responsabilidade Fiscal, estando sujeitos aos limites e condições impostas pela citada norma.

2. Os recursos repassados pela União destinados ao financiamento de estratégias, realizadas no âmbito da Atenção Básica em saúde, PAB Variável, integram o cálculo da Receita Corrente Líquida, conforme art. 2º, inciso IV, da Lei de Responsabilidade Fiscal (TCE/PE, Consulta nº 1005499-6, Tribunal Pleno – Rel. Conselheiro Valdecir Pascoal, j. 12.01.2011).

Neste sentido, vislumbrando que o quesito imposto pelo Consulente contempla atividades finalísticas da administração, mesmo que envolvam, eventualmente, recursos públicos federais provenientes de programas, projetos ou ações, e nestas condições devem ser contabilizadas como gastos com pessoal, a fim de integralizar os índices de despesas dessa natureza. (TCE/PR, Acórdão nº 1357/2018, Plenário. Rel. Conselheiro Aragão de Mattos Leão, j. 24.05.2018).

8.14. Conclui-se, desta feita, que os recursos financeiros recebidos pelo Município, provenientes de transferência da União, para o custeio das ações e serviços de saúde deverão compor o cálculo da Receita Corrente Líquida (art. 2º, IV, da Lei de Responsabilidade Fiscal), utilizada como base de cálculo para a composição do limite do gasto com pessoal, e as parcelas que forem destinadas ao pagamento de pessoal ativo deverão ser contabilizadas como gastos com pessoal, nos termos dos artigos 18 e 19 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

8.15. Resulta daí, pois, a impossibilidade de que os gastos com pessoal pagos com os recursos descentralizados pela União (transferência intergovernamental), ainda que sirvam para custear serviços relativos a atendimento de média e alta complexidade, sejam excluídos do índice de gastos com pessoal, calculado conforme art. 19 da Lei Complementar nº 101/2000, posto contemplar atividades finalísticas da administração. Cumpre assinalar que a tentativa de realocação de despesas com pessoal da área da saúde para outras fontes que não aquela definida pelos artigos 18 e 19 da LRF, causa desequilíbrio fiscal, na medida em que gera distorção dos índices de gestão.

8.16. Ademais, a título de acréscimo argumentativo, cabe assentar que, sob o ponto de vista financeiro, o conceito de despesa com pessoal independe da natureza do vínculo empregatício, bem como da avaliação jurídica sobre a legalidade ou da validade das contratações.

8.17.Diante do exposto, em consonância com o posicionamento do Corpo Especial de Auditores e do Ministério Público de Contas, VOTO para que este Tribunal de Contas decida no sentido de:

8.18. Conhecer parcialmente da presente consulta, deixando de admitir o primeiro quesito, por se tratar de provocação para firmação de Termo de Ajustamento de Gestão entre entes políticos, incompatível com a modalidade processual elegida, qual seja, a Consulta, que deve veicular dúvida objetiva a respeito da aplicação de dispositivos legais ou regimentais.

8.19. Conhecer da segunda indagação, por preencher os pressupostos legais de admissibilidade definidos no art. 150 e seguintes do Regimento Interno deste Tribunal, para assim respondê-la em tese, com caráter normativo:

Impossibilidade de que os gastos com pessoal pagos com os recursos descentralizados pela União (transferência intergovernamental), ainda que sirvam para custear serviços de saúde relativos ao atendimento de média e alta complexidade, sejam excluídos do índice de gastos com pessoal, calculado conforme os artigos 18 e 19 da Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal).

8.20. Determinar à Secretaria do Pleno que de ciência ao Consulente desta Resolução, bem como do Relatório e Voto que a fundamentam, nos termos da legislação, e que comunique o teor desta decisão, em especial quanto aos itens 8.4, 8.5 e 8.6 ao Governo do Estado do Tocantins, para que, querendo, se manifeste a respeito.

8.21. Determinar a publicação da decisão no Boletim Oficial do Tribunal de Contas, para que surta os efeitos legais necessários.

8.22. Após, á Coordenadoria de Protocolo Geral – COPRO, para que proceda ao devido arquivamento.

Documento assinado eletronicamente por:
DORIS DE MIRANDA COUTINHO, CONSELHEIRO (A), em 24/06/2020 às 11:04:06
, conforme art. 18, da Instrução Normativa TCE/TO Nº 01/2012.
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